Taittinger é um exemplo bem-sucedido de empresa familiar que conseguiu se reinventar, preservando valores como ética, dever e modéstia.
Uma das maiores e mais distintas marcas de champanhe do mundo, a Taittinger, é uma das poucas casas de champanhe da França que há quase um século continua nas mãos da mesma família. Dona de clássicos, como o cuvée Comte de Champagne, que fazem parte da wish list dos amantes da bebida, a Taittinger é uma das joias da cidade de Reims, conhecida como ‘‘Ville des Sacres” (Cidade Sagrada) devido ao grande número de reis da França que foram coroados na famosa Catedral de Notre Dame de Reims, entre os anos de 1027 e 1825.
Nas cerimônias de coroação, realizadas na catedral de estilo gótico, era costume servir champanhe, o que contribuiu para disseminar sua fama. Por isso, ficou conhecida como a bebida de reis e rainhas. Desde a década de 1940, a Taittinger está sediada sobre a abadia de Saint-Nicaise, local onde monges trabalharam desde o século 13.
O Fundador: Pierre-Charles Taittinger
Em 1915, o jovem oficial da cavalaria Pierre-Charles Taittinger, chega ao Château de la Marquetterie, localizado nos arredores de Reims, na França. Ele fica encantado com a propriedade do século 18, que possuía uma linda vinícola.
Em 1932, ele (que havia então se tornado um político importante de Paris) retorna ao château e adquire o castelo. Anos depois, compra também a vinícola Forest-Fourneaux, incluindo as vinhas plantadas desde o século XVIII com Chardonnay e Pinot Noir.
Durante a Idade Média, o castelo foi residência dos “Condes da Champanhe”. Além de senhores feudais, o local hospedava artistas e comerciantes de toda a Europa. Até hoje o château permanece fiel à sua vocação: sedia eventos e comemorações especiais realizados pela família Taittinger.
Segunda Geração: Tino para os negócios
François Taittinger, terceiro filho do fundador, homem com espírito visionário, audacioso, administrou a casa a partir de 1945. Muito jovem — tinha apenas 20 anos quando assumiu a direção dos negócios — ele batizou a marca com o nome da família e lançou as bases do que se tornaria o grupo familiar Taittinger.
Partiu dele também a ideia de ter a Chardonnay como variedade de uva dominante da marca, antecipando o que os consumidores do século 20 apreciaria: um champanhe que reunisse atributos como requinte, leveza e elegância. Nascia ali o estilo Taittinger. A estratégia se mostrou acertada, pois, com essa bebida, a marca ganhou reputação mundial.
Após a morte de François Taittinger num acidente de carro, em 1960, seu irmão mais novo, Claude, assumiu a empresa onde ficou até julho de 2005, quando a Champagne Taittinger foi vendida ao fundo norte-americano de private equity Starwood Capital.
Terceira Geração: retomada do negócio
O sucesso e a perenidade da marca Taittinger são baseados na ética, humildade e modéstia, que vêm sendo passados de geração a geração. Aos 66 anos, Pierre-Emmanuel Taittinger (membro da terceira geração) personifica esses valores.
Trabalhando na Taittinger desde 1976, ele não foi favorável à venda da empresa, mas teve de aceitar a decisão votada pela maioria dos acionistas. Contudo, a determinação e o orgulho da família o estimularam a lutar para retomar o negócio.
Assim, em 2006, com o apoio financeiro do banco Nord Est Crédit Agricole, recompra a companhia. A Casa Taittinger ficou, portanto, menos de um ano fora do controle da família.
A determinação e a busca constante pela excelência são traços herdados do pai, o respeitado Jean Taittinger, que foi prefeito de Reims, Secretário de Estado do Orçamento, entre 1971 e 1973, e ministro de Estado do presidente Georges Pompidou.
Pierre-Emanuel tem consciência da responsabilidade que é carregar o nome da família. “O nome Taittinger transmite as habilidades e os conhecimentos do passado e um compromisso com o futuro.”
Apaixonado pelo que faz, é um embaixador fervoroso da região de Champagne e de sua história e tradição. Não está interessado em elogios ou poder. “Cultivamos videiras, não egos na Taittinger.”
Visão, inspiração, estratégia contribuíram para moldar o destino da família e a reputação do negócio. O compromisso sempre foi com a qualidade e a busca da excelência, com o propósito de oferecer ao cliente um champanhe único.
“Vender um bom champanhe antes de nos vendermos. Cultivar modéstia e sempre mostrar a qualidade de nossos vinhos. Fazer de tudo para torná-lo delicioso.” Esse é o legado que Pierre-Emmanuel herdou dos seus antepassados e que faz questão de transmitir às futuras gerações.
Novas Gerações: perpetuando o legado familiar
Ao retomar ao negócio da família, Pierre-Emmanuel se cercou de uma equipe de jovens profissionais criativos e motivados. Uma mistura de talentos complementares que trabalha para preservar a tradição, a qualidade, a imagem e o futuro da marca.
“Nosso trabalho é antigo, mas a tradição precisa ser modernizada, revisada, precisa ser mantida viva. Esse é um equilíbrio delicado”, afirma o empresário.
Além da equipe escolhida cuidadosamente, ele conta ainda com o filho, Clovis, e a filha, Vitalie, que participam da gestão dos negócios desde 2007. Ambos trabalham ativamente do dia a dia da Taittinger, formando com o pai um trio afinado.
Clovis, o mais velho, supervisiona o desenvolvimento internacional do champanhe Taittinger, abrindo novos mercados. Cerca de 75% das vendas ocorrem fora da França. Nos últimos dez anos, ele conseguiu introduzir a marca em 150 novos países. Graduado pela EDHEC Business School, ele trabalhou muitos anos no mercado financeiro. Em 2007, a pedido do pai, que havia acabado de recomprar a Taittinger, ele foi ajuda-lo a revitalizar o negócio.
Vitalie Taittinger, formada em artes, é a diretora de marketing e comunicação e embaixadora da marca há 11 anos. Trabalhar ao lado do pai é uma forma de manter o espírito de família. “Fui criada com a ideia de que você precisa encontrar seu próprio caminho na vida e não apenas seguir um caminho já estabelecido para você.”
“Eu adoraria ter sido artista — estudei arte e esse era o meu plano –, mas fiquei tão impressionada com a dedicação de meu pai em recomprar a empresa da família que pedi para trabalhar com ele”, disse Vitalie.
Vitalie Taittinger: Sucessão Feminina
Vitalie compartilha com a Revista FBFE como está sendo o processo de sucessão do grupo e sua relação com o pai, Pierre-Emmanuel e seu irmão Clovis.
1- O que motivou seu pai a assumir o controle da empresa? Qual foi a reação da família?
Vitalie Taittinger – Meu pai veio de uma família que se dedicou a duas questões: a construção de um grupo de empresas de luxo (Baccarat, Hotel de Crillon, Lutetia, Hotel Martinez em Cannes, Champagne Taittinger, entre outros) e a construção do país (Jeans Taittinger, o pai dele, foi prefeito de Reims por quase 20 anos, além de ministro de Georges Pompidou). Era impossível para o meu pai aceitar o desaparecimento de sua história e todo o fantástico trabalho realizado pelo meu avô e tios. Essa provavelmente foi a razão dele ter brigado secretamente para recomprar a empresa em 2006. O resto da família, com exceção do núcleo mais próximo (pai, irmãos e irmãs) nem considerava que ele pudesse fazer isso, mas acredito que todos respeitaram a sua decisão.
2- Como está sendo o processo de sucessão entre o seu pai e você?
VT – Esta não é uma sucessão do meu pai para mim apenas. Não está tudo sobre os meus ombros! Acredito que meu pai tomou a decisão 100% seguro de que nós, como um time, especialmente meu irmão Clovis e nosso Gerente Geral, Damien Le Sueur, seríamos capazes de cuidar do futuro da Taittinger em total harmonia. Para nós a questão era: o que trará mais valor para a empresa com essa nova organização? Como podemos melhorá-la? Mantendo isso em vista, tudo tomou seu lugar de forma pacífica. Meu pai sempre teve muita confiança em nós, nos deu muita liberdade para cada um trabalhar em seu departamento dando o seu melhor.
3 – Como foi o processo de escolha do novo Presidente da empresa, levando em conta que você tem um irmão?
VT – Esta decisão foi o resultado de uma reflexão geral que tivemos com todo o time. Como expliquei acima, a questão que nós nos perguntamos foi: “como podemos estruturar essa organização de forma benéfica à empresa”. Qual o melhor lugar para cada um de nós, considerando seus talentos. A filosofia do meu pai sempre foi que o presidente deve cuidar de todos os funcionários, não existe um comando vertical, e sim horizontal. Então, sem ego, sem disputa de poder.
Clovis e eu somos muito diferentes e complementares. Meu irmão é um guerreiro, ele é responsável por 80% das nossas vendas estando à frente das exportações. Ele tem uma energia incrível e faz um ótimo trabalho com todos que trabalham para a marca ao redor do mundo. É uma habilidade muito valiosa e nós achamos que usando seu conhecimento de mercado e aplicando-a para o Marketing, traríamos uma potência incrível. Da minha parte, sempre fui a embaixadora da marca, a guardiã de sua imagem. Eu sou muito ligada a Região de Champagne, ao terroir local… Ambos temos missões muito importantes para a marca, nenhum de nós age como chefe do que o outro. Isso porque nos respeitamos e nos amamos.
4-Como está se sentindo em relação a se tornar a presidente de uma marca tão prestigiada como a Taittinger, depois de seu pai ter dedicado mais de 45 anos de sua vida ao setor de champanhe?
VT – Me sinto orgulhosa! Receber esse voto de confiança é algo grande! Também estou muito feliz de fazer parte dessa jornada, temos muitas coisas para fazer, imaginar, melhorar, aprimorar… o mais importante é que estamos trabalhando por algo mágico!
5- Quais são seus planos para os próximos 10 anos da empresa? Planeja lançar algum produto novo?
VT – O que eu posso dizer é que nosso foco prioritário será manter a qualidade excepcional de nossos vinhos, e sempre trabalhar para isso. Com certeza nosso maior comprometimento para os próximos anos. Estamos finalizando um ciclo e iniciando outro. Junto com a nossa equipe iremos pensar sobre essa nova jornada que estamos dispostos a percorrer. Logicamente pensamos em lançar novos produtos, mas ainda é muito cedo para falarmos sobre isso.
6- Qual o valor mais importante para a empresa e para a sua família?
VT – Os valores familiares significam muito para nós: cuidar de todos que trabalham conosco, cuidar do meio ambiente para as gerações futuras, sermos capazes de pensar no projeto a longo prazo.
7-Qual conselho você daria para as famílias empresárias que estão passando pelo processo de sucessão?
VT – Não tenham medo, conversem sobre tudo, isso pode ser uma grande oportunidade para o negócio. Proteja os valores mais importantes pra você e com quem está à frente do negócio. Isso garantirá o sucesso da sua empresa.
Os vinhedos
O vinhedo da família Taittinger atualmente cobre uma área de 288 hectares, o terceiro maior da região de Champagne. Ele está situado em Val-de-Murigny, próximo à antiga estrada construída nos tempos romanos, que liga Reims a Epernay. No vinhedo, 37% da área plantada são videiras de Chardonnay, 48%, de Pinot Noir e 15%, de Pinot Meunier, que se destacam entre as melhores uvas da denominação de Champagne.
As videiras são cultivadas com as mais modernas técnicas agrícolas e também métodos de cultivo orgânico. Cerca de 45% das uvas utilizadas no processo de produção do champanhe são de videiras próprias, o que é importante para manter o rigoroso controle de qualidade da bebida.
A BestChampagne, publicação especializada, destaca em seu site que a Taittinger prolonga o período de envelhecimento de seus champanhes além do tempo mínimo legal – três a quatro anos para o Brut Réserve e quase dez para o cuvée Comtes de Champagne. Esse processo apurado garante mais qualidade e estilo a bebida, tornando a especial.
Os champanhes amadurecem em caves a 18 metros de profundidade, incrustradas na terra calcária, o que traz singularidade ao sabor dos champanhes Taittinger.
