Nelson Cury Filho*

As gerações mais jovens devem herdar nas próximas duas décadas a gigantesca cifra de US$ 84 trilhões, a maior transferência de riqueza da história, segundo levantamento do banco suíço UBS. Essa fortuna refere-se às sucessões familiares que devem ocorrer nos Estados Unidos. A esperada migração gigantesca de recursos para os millenials (nascidos entre 1981 e 1996) e geração Z  (1995 a 2010) deve acelerar a transição para um modelo de negócios mais sustentável. 

A nova geração de herdeiros que assumirá o comando dos family offices e empresas familiares valoriza as práticas sustentáveis e, nesse sentido, acredita que as empresas precisam ter propósito e estar comprometidas e conectadas às questões sociais. 

Para esses jovens, a agenda ESG (Environment, Social and Governance) não é uma modinha, mas um caminho sem volta a ser perseguido pelas companhias que buscam resultados de longo prazo e geração de valor além do ponto de vista financeiro. O conceito ESG se refere ao equilíbrio das boas práticas ambiental, social e de governança corporativa, de modo a assegurar a perenidade e a competitividade dos negócios.

Igualmente importantes, esses três aspectos contemplados pela sigla estão dando um novo sentido aos negócios.  “Nunca fizemos uma transição como a que precisamos fazer nos próximos 30 anos. Não há precedente para isso”, afirmou Bill  Gates, o bilionário cofundador da Microsoft,  numa entrevista à BBC ao falar sobre mudanças climáticas, tema do seu livro Como evitar um desastre climático

Desde 2016, o megainvestidor Warren Buffet vem fazendo doações bilionárias a fundações dedicadas a causas de impacto social.  A imprensa costuma reproduzir uma declaração dele à CNN que expressa bem o seu pensamento sobre o melhor destino para a fortuna acumulada: “Eu não fiz nenhum sacrifício nem minha família. Juros compostos, longo prazo, sócios maravilhosos e nosso país incrível fizeram a mágica funcionar. A sociedade tem um uso para o meu dinheiro; eu não.”  Uma das maiores autoridades no estudo de empresas familiares, o professor do MIT  e fundador da Cambridge Family Enterprise Group, John Davis, resume muito bem a importância da governança: “Em empresas familiares, a falta de governança efetiva é uma das principais causas de problemas organizacionais. Todas as empresas capazes de melhorar a governança colheram benefícios duradouros”.

Para eles – assim como para investidores como Larry Fink, CEO da maior gestora do mundo, a BlackRock,  que administra uma carteira de US$ 10 trilhões ativos -,sustentabilidade e rentabilidade não são excludentes.  É possível ter crescimento econômico respeitando o meio ambiente e promovendo a justiça social. Sustentabilidade e capitalismo tem sido tema constante das tradicionais cartas aos clientes assinadas pelo CEO da BlackRock, que vem alertando sobre a necessidade de as organizações se comprometerem com modelos de negócios que busquem atingir a neutralidade em emissões de gases do efeito estufa até 2050. 

Num mundo globalmente interconectado, uma empresa deve criar valor e ser valorizada por todos os elos com que se relaciona, ao mesmo tempo em que busca resultados de longo prazo para os seus acionistas, defende Larry Fink.  “Não se trata de política. Não é uma agenda social ou ideológica. Não é justiça social. É o capitalismo, conduzido por relacionamentos mutuamente benéficos entre você e os funcionários, clientes, fornecedores e comunidades nos quais sua empresa depende para prosperar. Esse é o poder do capitalismo”, destaca numa das cartas.

Atentos às inúmeras oportunidades criadas nessa jornada para a neutralidade de carbono, os investidores, numa velocidade cada vez maior, vêm redirecionando seus recursos para ativos e negócios atrelados às métricas de sustentabilidade.

Segundo dados da BlackRock, entre janeiro e novembro de 2020, os investidores de fundos mútuos e ETFs globais investiram US$ 288 bilhões em ativos sustentáveis, um aumento de 96% em relação ao ano todo de 2019. No Brasil, levantamento da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) indica um crescimento de 74% no número de fundos de ações que se enquadram na temática sustentabilidade e de governança corporativa de 2008 a março de 2022.

A percepção sobre a necessidade de incorporar as práticas sustentáveis aos negócios e aos investimentos ganhou um sentido de urgência com a pandemia e a Guerra na Ucrânia. O novo contexto geopolítico, marcado pela ameaça global de uma crise de energia, evidenciou a necessidade de o mundo priorizar fontes mais sustentáveis de energia, alinhadas a uma agenda global de combate à mudança climática. 

No âmbito internacional, o Acordo de Paris, de 2015, é uma das principais referências do debate climático. Contudo, a grande maioria dos países deixou de fazer a sua lição de casa: reduzir suas emissões e, deste modo, atingir a meta global de evitar que a temperatura do planeta suba mais de 1,5O até 2030.  

Referência em energia limpa e renovável e dono da maior floresta do mundo, o  Brasil sempre foi um player importante na arena climática. A expectativa é que o país volte a assumir um papel de protagonismo no enfrentamento dessas questões com sua participação na Conferência sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP27), realizada no começo deste mês de novembro, no Egito. Desde a criação da COP, o Brasil sempre teve atuação de destaque, por isso os holofotes do planeta se voltam novamente para o país na esperança de que o novo governo possa conter o avanço da derrubada da floresta amazônica, contribuindo assim para o avanço da agenda ambiental.

Segundo estudo divulgado na Cúpula do Egito pela consultoria Systemiq e divulgado pelo jornal Valor Econômico a economia verde possa aumentar entre US$ 100 bilhões e US$ 150 bilhões por ano o PIB brasileiro, mas para que possamos liderar uma economia de baixo carbono são necessários investimentos do setor privado e público estimados entre 2% a 4% do PIB pela mesma consultoria.

Cientes de que o compromisso com um mundo mais sustentável e igualitário deve ser abraçado por todos, não faltam exemplos de empresários e herdeiros que se dedicam às causas ambientais e sociais. Bill Gates, da Microsoft,  fundou junto com Warren Buffet o The Giving Pledge, que mobiliza as pessoas mais ricas do planeta a doarem suas fortunas para combater problemas globais. O fundador do Nubank, David Vélez, prometeu doar a sua fortuna de US$ 5 bilhões em vida.  Peggy Rockefeller, quarta geração da família, fundou o Instituto Synergos. 

Aqui no Brasil também temos inúmeros exemplos de que investir na economia verde é saudável para os negócios. Como é o caso da família Garfinkel, da Porto Seguro, que desenvolve várias iniciativas na área ambiental, Leandro Melnick, da construtora Even que se destaca pelo pioneirismo em práticas de ESG no ramo imobiliário, a família Klabin, do ramo de papel e celulose, é uma das referências em ESG no país na frente ambiental.

A transição para um mundo neutro em carbono abre inúmeras oportunidades de investimento nas áreas não apenas de energia, mas de transporte, manufatura, construção e agricultura entre outras como mostram os exemplos acima. Mas é preciso, mais do que nunca, engajar o capital à causa.

*Nelson Cury Filho é fundador do Fórum Brasileiro da Família Empresária-FBFE e proprietário da Cedar Tree Family Business Advisors

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Fontes pesquisadas: 

https://johndavis.com/governing-the-family-run-business/
https://br.noticias.yahoo.com/megainvestidor-warren-buffett-doou-metade-da-fortuna-mas-ainda-tem-r-490-bilhoes-174227354.html?guccounter=1&guce_referrer=aHR0cHM6Ly93d3cuZ29vZ2xlLmNvbS8&guce_referrer_sig=AQAAABUmaB_sS-WDmWYvN7sH3r5aS-9cl7zQ1U4aaEHX7DIxuk_c1o8IHOsqgZRq6_UeYX0bZXlbjrb5hllYQC-C0x0OyGeaE_jdLngjj5t-v_imCRqsx1yIJ46s2SeYeoRF1YhaPyU1DGH4tKzKZwfmfQIYYC5lSBs9_ClCMrSLkC1p
https://www.bbc.com/portuguese/geral-56084218

https://einvestidor.estadao.com.br/negocios/carta-larry-fink-blackrock-2022-esg-capitalismohttps://valor.globo.com/mundo/cop27/noticia/2022/11/09/brasil-tem-potencial-para-liderar-economia-mundial-de-baixo-carbono-diz-estudo.

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