Patrícia Cardim é a quarta geração da família à frente da Belas Artes e começou a trabalhar na instituição aos 15 anos; aos 26, tornou-se diretora-geral.  Como muitas das histórias das famílias empresárias, o início da trajetória de um profissional, geralmente é marcado pela perde de um ente querido. A famosa sucessão.

No caso de Patrícia Cardim, seu pai que dirigia a Instituição ficou com câncer. Os médicos alertaram a família que ele só teria seis meses de vida pela frente. Patrícia, que já trabalhava há 11 anos na Belas Artes foi pega de surpresa, mas como já havia passado por quase todos os departamentos da empresa, se sentia apta a assumir o cargo, até porque ninguém mais da família queria fazê-lo.

“Aquele momento foi um presente, embora tivesse sido um período de muita dor e de conversas muito difíceis. Precisei ter uma conversa dura com minha família, para falar sobre a morte de meu pai. Tive que estruturar o testamento, documentações. Não foi nada fácil, foram 9 anos de quimioterapia” completa Patrícia Cardim.

Paulo Cardim, o pai de Patrícia ainda está vivo, todavia a doença era de fato grave e ele ficou em tratamento por longos 9 anos e teve mesmo de sair do dia a dia do negócio. Segundo Patrícia, essa escolha foi legítima, mas teve dores no caminho.  A Belas Artes que a Patrícia encontrou, ainda era sisuda, bastante masculina.

Na universidade ainda havia poucas mulheres ensinando. Havia poucas alunas também. Nos primórdios era tudo muito protocolar onde não existia a leveza das empresas de hoje.  A escola foi fundada por Pedro Augusto, que veio para o Brasil, filho de um maestro muito famoso, vindo de Porto, Portugal, já formado advogado e jornalista. Ao chegar em São Paulo, foi deputado, vereador, superintendente da cidade de São Paulo que cuidava da segurança da cidade.

Ele achou tudo um marasmo por aqui. São Paula ainda não tinha uma vida cultural. Ele foi membro fundador do Conservatório de Música, da Academia de Letras, da Semana de Arte Moderna de 22 e fundou a Belas Artes, com 60 anos. Falecendo, aos 67 anos. Não tinha filhos. Mas deixou uma consolidação cultural sobre o que era a missão da Belas Artes, como o centro de ensino deveria se comportar. Foi um homem muito à frente do seu tempo.

Quando ele deixa a Belas Artes como legado, a escola vivia de doações da família e de artistas e ocupava prédio do Governo. O tio avô de Patrícia, Carlos Alberto, assume a Belas Artes, tímida de tamanho, mas imponente em termos de reconhecimento. Ele não mexe no que Carlos Alberto fez, mas estabelece uma metodologia de ensino. Forma um corpo docente forte.

A terceira pessoa, pai de Patrícia, Paulo Cardim, entra na escola e dá o tom de consolidação da empresa. Ele foi uma potência empresarial que passou por fases desafiadoras e sempre foi muito resiliente. Patrícia acompanhou toda a luta dele pela liberdade de cátedra e ela o tem como grande mentor e inspirador. Foi Paulo também quem a provocou ao extremo para que sua sucessora desse o seu melhor.

Patrícia tem três irmãos. Nenhum trabalha na Belas Artes, mas são acionistas da empresa. Quando Patrícia entrou na instituição, passou por vários departamentos, inclusive pela área acadêmica, a qual se apaixonou.

Ao assumir aos 26 anos, Patrícia Cardim enfrentou rejeição de alguns gestores. Não apenas por ser mulher, mas por causa da estatura de 1 metro e meio e a cara de menina. Achavam que ela era uma criança, mas ela se sentia segura. Conhecia a empresa e sabia que estava a serviço da instituição. Patrícia contou que, em relação ao pai, sua gestão teve uma diferença: ela vive um conflito interno que o pai não viveu. Que é a escolha de priorizar entre a família e a empresa.  “Ele sempre optou pela empresa, o que é muito natural para o homem. Mas para a mulher, não” desabafa.

É esperado que uma mulher seja generosa, altruísta e não mandona e individualista. Autonomia para mulher é mais pesada do que para o homem. Patrícia Cardim afirma que não considera a sua gestão melhor ou pior do que a gestão do pai por ser do gênero feminino. O grande abismo que existe é na percepção do feminino, quando toda a vez que entrava em reunião citavam a frase: “mas é uma menina”.

“Isso era cansativo, pois tinha sempre que provar minha competência. Ser filha do dono é outro complicador, há de se provar competente dia a dia. Outro peso da mulher são os múltiplos papéis que ela exerce. Há também a questão estética” afirma.

Patrícia gosta de se arrumar, de se maquiar. É vaidosa! Nos meios acadêmicos, isso não é muito bem visto. Então, é necessário se provar todos os dias. E no fundo, por ser mulher, fica mais complexo ainda.

“Todavia são escolhas. A mulher, por vezes, para a carreira em cargo de gerência, porque assumir a alta gestão gera conflitos e cobranças de todas as ordens. O importante é conseguir fazer tudo que for possível, da melhor maneira possível” finaliza Patrícia Cardim.

Hoje a Belas Artes tem cinco mil alunos e 600 colaboradores.

Matéria publicada no portal do Fórum Brasileiro da Família Empresária.

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